sexta-feira, 6 de março de 2009

A Barca do Sol - "Pirata"


Hoje chega ao fim esse grandioso cruzeiro por toda a discografia d’A Barca do Sol, passando por mares agitados, calmarias, e paisagens intangíveis, vislumbrados apenas por meio de boa musica. O derradeiro álbum da banda, “Pirata”, é também o menos reconhecido de todos, não possuindo nem sequer uma versão em CD. Trata-se, porém, de um trabalho que faz jus ao restante da obra do grupo, cheio de momentos inspiradíssimos – como é de praxe quando o assunto é A Barca.

Já sem o violoncelo de Morelembaum, a banda apresenta uma razoável mudança de sonoridade no disco, talvez esse o fator responsável pela menor atenção dada a ele pelos admiradores do conjunto. Os ritmos brasileiros possuem maior evidência no álbum e, ao mesmo tempo, unem-se, em algumas composições, a estruturas e formas características do Progressivo, produzindo um resultado pra lá de satisfatório.

Exemplo dessa valorização à musica genuinamente nossa, “Vô Mimbora Pro Sertão” abre o disco de maneira regionalista, com vozes harmonizadas, letra simples, e percussão, com direito até a um solo de berimbau ao final da faixa.

O mesmo berimbau dá início a “Tereza Boca do Rio”, uma espécie de baião bem sóbrio, ao estilo d’A Barca. A bela faixa conta com simples e ótimos arranjos de voz, flauta, baixo, violões e percussão – além do já citado berimbau. Um momento bastante aconchegante e suave.

Emendada à canção anterior, “Mercado das Flores” mostra-se uma composição ainda melhor, repleta de variações rítmicas e instrumentais, ainda evidenciando a sonoridade brazuca, contendo, por exemplo, pitadas de samba – com direito à percussão caprichada – e musica mineira, numa amálgama muito coesa e de bom gosto. Destaque para os maravilhosos bandolins, que realmente fazem a diferença na faixa.

“Cavalo Marinho”, apesar de já ter sido lançada em “Corra o Risco”, supera tal versão devido à presença de duas vozes, em contraste com o vocal solitário de Olívia na primeira gravação. Os arranjos de violões são muito bem trabalhados, contendo um belo solo entre as partes cantadas. Outro motivo por que a versão de “Pirata” supera à de “Corra o Risco” é a menor repetição da letra.

A veia Prog do disco aparece pela primeira vez em “Jando”, mesclando arranjos abrasileirados a um Rock Progressivo extremamente competente e trabalhado. Os teclados são muito bem executados, assim como a bateria inquieta e quebrada. A banda foi muito feliz nessa mistura, criando, realmente, o “Prog à brasileira”, ao invés de simplesmente intercalar trechos de musica brasileira pura e, posteriormente, arranjos progressivos cheirando à Inglaterra.

Na seqüência, a emocionante “Jardim de Infância”, dispensando maiores detalhes devido a sua presença no já comentado álbum de estréia de Byington – apesar de aqui a canção parecer estar ainda mais deslumbrante.

Outro momento agradabilíssimo é “Desencontro” e sua bela melodia. Os arranjos discretos e requintados dão sabor emepebístico e jazzístico à obra.

A maravilhosa “Estrêla” merece grande destaque. Sua inspiradíssima melancolia agrada em cada mudança de acorde. Uma canção a ser bebida aos poucos, dotada daquela atmosfera intimista bem familiar aos fãs d’A Barca. A canção possui alguma coisa de Jazz, e um piano com dose extra de feeling. Muito bom!

Em contraste absoluto com qualquer outra composição da banda, “Manoel” já vem esculachando de cara, com seu sambinha tão malandro quanto o protagonista da canção. Muito divertida e descontraída, a faixa, apesar de ser um samba, contém uma bateria roqueira e solo de guitarra. O contrabaixo acústico também marca presença, assim como em diversas outras faixas do álbum.

“Rio Preto”, a exemplo de “Jando”, ostenta arranjos característicos do Progressivo mesclados à musica brasileira, sendo, porém, um pouco menos agressiva.

A instrumental “Canção Pra Ela” finaliza o disco de maneira comportada, não possuindo nenhuma característica muito marcante. Trata-se, contudo, de uma bela faixa.

E assim termina nossa saga musical, guiada por esse grupo de grande importância para a música nacional e de onde saíram renomados instrumentistas e compositores. Vale a pena comentar também a arte gráfica do disco, cujo autor é completamente desconhecido por mim. Trata-se, porém, de uma ilustração muito interessante, feita toda em escala de cinza, contendo um navio pirata, é claro, e diversos outros elementos condizentes à temática do álbum.

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